Professora de Antropologia aposentada do Departamento de Antropologia, Política e Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - UNESP - Araraquara – SP. Trabalhei vinte e quatro anos nesta universidade em regime de tempo integral. Realizei a Graduação em Ciências Sociais (1976) e o Mestrado em Antropologia Social (1983) pela Universidade Estadual de Campinas. O Doutorado em Ciências Sociais (Antropologia) foi cursado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1994).
Hoje sou pesquisadora de modelos de cura e escritora. Estudo as condições pré-programantes, programantes, estruturantes e desencadeantes que atuam entre as forças da vida e as forças da morte nas doenças e sofrimentos. Iniciei minhas pesquisas com temas e problemas relacionados ao debate antropológico contemporâneo nas várias modalidades de razão e de produção simbólica, sobretudo no que toca ao modelo biomédico em sociedades complexas, às representações sobre doenças e eficácia simbólica de cura e aos processos iniciáticos entre benzedeiras no interior do amplo espectro de medicinas populares. Um eixo também significativo de meus estudos foi o de movimentos sociais urbanos, com foco nas lutas coletivas por saúde. Quando comecei a compreender as dimensões vibracionais atuando nesses estudos, fiz uma reparadigmatização do conhecimento através da Antropologia do Imaginário.
Há vinte anos iniciei meus estudos em Antropologia do Imaginário criado pela Escola de Grenoble, França, entre os finais dos anos 70 e anos 80. Após realizar uma revisão crítica do método positivista e do historicismo (ambos agnósticos) e do pensamento eclesial (gnóstico), a Antropologia do Imaginário construiu um pensamento gnóstico, mas não eclesial, no qual pensa o símbolo como elemento de mediação entre os fenômenos. A qualidade desta reflexão resultou um fecundo diálogo sobretudo com Lévi-Strauss e Freud, apoiado nas pesquisas de Gaston Bachelard, Carl Gustav Jung e Henry Corbin e nas calorosas discussões realizadas anos a fio no Círculo dos Eranos, em Ascona, suíça italiana. Este paradigma nos apresenta a noção corbiniana de exílio do Ocidente, um confinamento da nossa alma e da nossa humanidade ao método positivista, racionalista e historicista, razão do impedimento de realizarmos um retorno à nossa origem, nossa dimensão espiritual.
Como uma hermenêutica que constrói o sentido transversal dos fenômenos estudados, a Antropologia do Imaginário abarca uma complexa epistemologia que dialoga com mais de vinte teorias (todo o legado historicista da Antropologia, a psicologia analítica junguiana, a física quântica, as neurociências, a geografia, o legado filosófico do modelo ocidental do pensamento, as gnoses orientais persas, judaicas e iranianas). Este paradigma se propõe a ampliar o campo de indagação antropológica reconstruindo as rupturas da história da filosofia que resultaram nesse exílio da alma humana presente no projeto científico. Esta hermenêutica realiza um projeto hermenêutico por meio dos conceitos de imaginário, anti-história da anti-filosofia, trajeto antropológico como um trajeto de sentido, estruturas antropológicas do imaginário, homem tradicional, ratio hermetica, mundus imaginalis, alma do mundo, corporeidade, dentre outros.
Só assim este paradigma pode, finalmente, conceituar o campo da realidade sensorial vibracional como um dos campos da realidade imaginal, reduzindo a distância que separa a alma do homem da alma do mundo, espaço intermediário situado nesse entre dois: entre o mundo sensível e o mundo inteligível. E assim, este paradigma compreende que a espiritualidade não está apartada do corpo, é possível acessá-la para encontrá-la no âmago da nossa existência, este ponto fulcral de transformação, o que muda substancialmente a compreensão da condição existencial do homem.
Perpassa toda a obra de Gilbert Durand uma discussão, ora mais ora menos explícita, sobre a natureza da realidade e a natureza do conhecimento. Não foi tarefa pequena a de resolver os eixos de disputas entre escolas antropológicas sobre o binômio natureza-cultura, e ainda incluir a função fisiológica da imaginação atuando na construção dos símbolos através das pesquisas de reflexologia da Escola Russa de Leningrado. Este conjunto de indagações possibilitou à hermenêutica do imaginário uma compreensão sobre como domificar o tempo e como se forma o nosso processo de hominização. Ele nos nutre com uma hermenêutica, na qual a imagem é uma fonte de cognição. O que se ouve gera ou mobiliza imagens, manifestas ou latentes, que se transformam em símbolos e em narrativas, e que como mediadores, são uma gnose não eclesial. A aglutinação significativa dos símbolos obedece à uma lógica, a dos símbolos serem variantes de um mesmo tema mítico ou arquetipal, apresentando graus de tensão entre si. A constelação dos símbolos se processa, então, neurobiologicamente, isto é, a como se responde ao terror diante da morte, eixo deste paradigma.
Os registros reflexológicos dominantes - diferentes mas complementares – atuam em cada um de nós e condicionam todo o processo de simbolização. Atacamos de frente o medo da morte, nosso maior inimigo? Afastamos inconscientemente o medo da morte? Ou combinamos várias maneiras alternadas para enfrentá-la? Os níveis sensoriais – como registros reflexológicos que são, com as suas respectivas orientações semânticas - condicionam e conduzem todo processo de simbolização como uma ação neurobiológica. Estes registros reflexológicos encontram-se em cada estrutura antropológica do imaginário predominante (heróica, dramática e mística) e em seus regimes de imagem (diurno e noturno), e em cada cogito corporal, encarnando-se e dinamizando-se por meio dos schèmes, esses trajetos encarnados.
Apoiado no Corpus Hermeticum, Durand nos traz a dimensão iniciática para o interior da compreensão da condição humana ao criticar o antropocentrismo presente na ciência positivista e ao construir uma ciência cosmocêntrica, na qual homem e cosmos funcionam como microscosmo de macrocosmo. Este conhecimento possibilita a construção do cogito corporal e a realização de uma exegese da alma humana, contudo num movimento de gênese recíproca entre corpo e alma (trajeto antropológico), o que significa que não há uma anterioridade da consciência sobre a matéria, mas do inconsciente coletivo (estruturas antropológicas do imaginário).
Estudioso de Corbin, Durand assimilou os conhecimentos dos alquimistas do sul da Itália, quando a hermenêutica do imaginário fez o reconhecimento da existência da realidade imaginal revelada por meio de um saber que se chama angeologia, na qual é possível comunicar-se com a alma do mundo porque o universo é concebido como sendo revelador. E a Antropologia deixa de ser uma ciência setorizada e historicista para ser um ciência mítica, abrangente, sem fronteiras e espiritualizada, na qual a arte, a poesia e o mito nos ajudam a construir o homem biopsicossocial. Como um todo, tal compreensão se abre à uma iniciação, possibilita a realização da exegese da alma, na qual uma vez mais, todo o corpo participa da formação do símbolo. O trabalho do hermeneuta do imaginário é fazer equivaler o conhecimento do mundo ao conhecimento de cada cogito corporal, o que constitui a mais preciosa dádiva ofertada por este paradigma.
Com um foco neste contexto, as pesquisas que desenvolvo discutem o reino das analogias e o dinamismo de religação das diferenças nas concepções de doenças e no campo simbólico das eficácias de curas de vários modelos. Por meio dessas pesquisas procuro compreender a condição humana como parte constitutiva do objeto antropológico e do conhecimento sobre o homem. Algumas pesquisas desenvolvidas e em desenvolvimento se encontram à frente, no ítem Pesquisas e Orientações.
Atuei nas seguintes áreas do conhecimento: teorias antropológicas sobre doenças (Medical Anthropology, L’Anthropologie de La Maladie e Antropologia da Saúde) para compreender as doenças como parte de processos culturais; Antropologia do Imaginário, Antropologia Estrutural, Marxismo Antropológico e Métodos e Técnicas de Pesquisa Antropológica.
Participei ativamente dos Ciclo de Estudos Sobre o Imaginário (Congresso Internacional) em Recife (UFPE), tendo integrado a comissão científica nos quatro últimos encontros. Atuei também como coordenadora de vários fóruns temáticos no interior desses Ciclos. Integrei uma linha de pesquisa junto à Pós-Graduação de Sociologia da UNESP –Araraquara denominada Gênero, Identidades e Etnias. Ofereci com regularidade um Grupo de Trabalho com alunos de Graduação em Ciências Sociais e de Pós-graduação denominado Organização dos Sistemas Simbólicos: doença, ratio hermética e processos iniciáticos.
Desta forma, situo-me no âmago da problemática ontológica e cosmológica da Antropologia do Imaginário que busca compreender as forças míticas que atuam em nossas vidas. Como todo professor universitário, minha vida é de ensino, pesquisa, viagens para dentro e fora do país, congressos e, quando na ativa, extensão de serviços à comunidade. Colaborei junto à produção de um vídeo denominado Benzedeiras de Minas realizada pelo cineasta Andrea Tonacci.
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